O futuro da arte também é indígena
- Pedro A. Duarte
- 24 de abr.
- 13 min de leitura
Ailton Krenak e Cibele Forjaz revisitam a ópera “Il Guarany” de Carlos Gomes, trazendo os povos indígenas para o palco do Theatro Municipal de São Paulo
É preciso ser honesto. Eu entendo muito pouco de ópera: não sei identificar os movimentos musicais e quais são as diferenças entre eles. Mas uma ópera não deixa de ser uma arte cênica, irmã do teatro. Então, esta apreciação sobre a montagem de Il Guarany (ou Os Guaranis), concebida por Ailton Krenak e encenada por Cibele Forjaz para o Theatro Municipal, irá focar mais na encenação do que na música. Peço desculpas ao meu conterrâneo Carlos Gomes pela falta de conhecimento operístico e peço licença aos povos indígenas brasileiros para falar um pouquinho sobre eles. E, com isso, vamos começar.
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1800 e tanto: Panorama geral
Il Guarany (1870), é uma ópera composta por Antônio Carlos Gomes (1836-1896), compositor campineiro de renome internacional. Sua história foi adaptada a partir do romance de José de Alencar (1829-1877), O Guarani (1857), pelos italianos Antonio Scalvani (1835-1881) e Carlo D’Ormeville (1840-1924) responsáveis pelo libreto (as letras das canções e a dramaturgia). Apesar de ser adaptada de um livro brasileiro e seu autor principal também ser brasileiro, a ópera é cantada em italiano já que sua concepção ocorreu naquele país.
Em 1863, o compositor partiu em viagem para a Europa, graças a uma bolsa de estudos concedida pelo Império, com um objetivo: escrever e produzir uma ópera nacional, que apresentasse o Brasil para o mundo. Ele partiu para a Itália, onde estudou no Conservatório de Milão sob a tutela de Lauro Rossi (1810-1885). Como um estrangeiro, ele sentiu na pele a xenofobia e o racismo durante sua estadia, sendo inclusive descrito como “um selvagem” por artistas e jornalistas italianos. Vale relatar que Carlos Gomes tinha a pele morena e chegou a participar da campanha pela abolição da escravatura, após obter seu reconhecimento enquanto compositor.
Apesar do preconceito que sofreu, Carlos Gomes conquistou seu espaço na cena lírica italiana. Ele compôs as revistas musicais Se Sa Minga (1867) e Nella Luna (1968). Os espetáculos se tornaram sucessos populares e trechos das canções de Se Sa Minga, compostas em dialeto milanês, eram cantarolados pelas ruas da cidade. Ainda em 1867, enquanto procurava um argumento que o projetasse definitivamente na Itália, ele encontrou um garoto vendendo nas ruas uma tradução do romance de José de Alencar que lhe chamou a atenção.
Il Guarany estreou em 19 de março de 1870 no Teatro Alla Scala. Situada no século 17, durante o período colonial, o enredo conta a história de amor entre o indígena Peri e a portuguesa Cecília, filha do fidalgo Don Antonio (figura histórica tida como um dos fundadores da cidade do Rio de Janeiro). A trama inicia com o assassinato de uma indígena aimoré por um colono, o que leva a tribo a entrar em guerra contra os portugueses. Em meio a isso, o explorador espanhol Gonzales, apaixonado por Cecília, elabora uma plano para raptá-la e depor Don Antonio. Cecília é resgatada por Peri pelo menos umas três vezes no decorrer da história e, após a derrota dos aimorés e de Gonzales, Don Antonio dá a bênção para que Peri a leve para morar com ele na floresta — acreditando que, lá, ela estaria a salvo.
Tanto o romance quanto a ópera, de alguma maneira, tinham a intenção de construir aquilo que seria uma “identidade brasileira”, trazendo a figura dos indígenas como peça fundamental. Ainda assim, a ópera apresenta algumas anomalias. Além de ser cantada em italiano, ela tem como modelo as óperas românticas oriundas da França e Itália do século 19, trazendo o exotismo cultural como um de seus elementos. O exótico de Il Guarany era justamente um dos grupos de antagonistas: a tribo de canibais, os aimorés. Era o retrato de um Brasil para o olhar europeu.
A primeira récita ocorrida em solo brasileiro foi em 02 de dezembro de 1870, no Theatro D. Pedro II (edifício que, infelizmente, foi demolido em 1934). A primeira apresentação no Teatro Municipal do Rio de Janeiro ocorreu em 03 de agosto de 1914, o elenco era formado pela soprano brasileira Nícia Silva e os cantores estrangeiros José Palet, Giuseppe Danise, Giulio Cirino e Bernardo Berardi, sob a regência do maestro Edoardo Vitale.
O Theatro Municipal de São Paulo teve sua inauguração na noite de 12 de setembro de 1911, coroada pela protofonia de Il Guarany (ou seja, o trecho inicial da ópera - aquele, que virou música-tema do programa radiofônico A Voz do Brasil), dando início às atividades que ocorreriam no Theatro. Passaram-se alguns anos até que a ópera fosse apresentada na íntegra naquele palco, em 10 de outubro de 1919, sob a batuta do maestro Vicenzo Bellezza e com os solistas Giuseppe Tacani (Peri), Zola Amaro (Cecília). Evidentemente, os atores que interpretaram Peri e o coro que representava os aimorés não eram indígenas — não exatamente pela falta de cantores líricos que tivessem essa origem, mas realmente pela falta de preocupação com esse tipo de representação. Il Guarany foi apresentada ainda 18 vezes no Theatro Municipal até os povos indígenas finalmente subirem ao palco para contar essa história.

2023 e 2025: Os Guaranis no Theatro Municipal
Em 12 de maio de 2023, ocorreu a primeira das sete apresentações da vigésima montagem de Il Guarany no Theatro Municipal de São Paulo, dessa vez com um diferencial: o espetáculo foi concebido pelo ambientalista, filósofo e líder indígena Ailton Krenak. A direção musical ficou a cargo do maestro Roberto Minczuk, quem propôs o desafio de reencenar esta ópera; a direção cênica foi realizada por Cibele Forjaz; e Simone Mina atuou ao lado de Denilson Baniwa, artista visual indígena, na direção artística e cenografia.

Esta montagem veio para corrigir um erro histórico: a ausência de indígenas na concepção e realização das apresentações anteriores da ópera. Assim, a cena de abertura tinha início com a projeção de um vídeo no qual Denilson Baniwa desenhava figuras em um tule de projeção (que servia de cortina) de modo que, aos poucos, elas compunham uma floresta inteira. Ao longo do espetáculo, diversas projeções reproduziam as imagens de animais e plantas criadas por Denilson não só no cenário da peça, como também em todo o Theatro Municipal, contrastando com as pinturas presentes no telhado e reelaborando a boca de cena.
Ao longo da ópera, David Vera Popygua Ju e Zahy Tentehar Guajajara atuaram lado a lado com os solistas Atalla Ayan / Erique Bravo e Nadine Koutcher / Débora Faustino para interpretar Peri e Cecília, respectivamente. Eles serviam como os “avatares” dos cantores líricos, como se David e Zahy fossem os corpos que acolhiam as vozes. Aos poucos, essas duplas se desconectavam; com isso, David e Zahy passavam a interagir a seu modo com o que estava ocorrendo em cena. Essa ideia dos duplos vinha da noção de polifonia do sujeito, misturada com dispositivos do Teatro Épico, possibilitando que se revelassem as contradições daqueles personagens.
À esquerda, o solista Atalla Ayan e o ator David Vera Popygua Ju interpretando Peri. À direita, Nadine Koutcher e Zahy Tentehar interpretando Ceci. Fotos: Stig de Lavor / Theatro Municipal
Tanto no romance de Alencar quanto na ópera de Carlos Gomes, a figura de Peri é estereotipada a partir do imaginário colonial sobre o indígena, de forma que a presença de David e Zahy vinha para contrastar com essas noções, disputando essa visão dominante. Era também interessante reparar que o figurino dos cantores líricos que interpretavam Peri e os aimoré possuíam uma concepção própria, sem ser inspirado em vestimentas indígenas: os cantores líricos vestiam túnicas cobertas por cordas, muito diferentes das jaquetas e calças usadas pelos colonos — referência que só ficava evidente no início do terceiro ato da ópera.
E, ainda mais interessante que tudo isso, nesta montagem o corpo de baile e a composição elaborada por Carlos Gomes que acompanha a cena de ballet no terceiro ato foram suprimidas. No lugar, a Orquestra e Coro Guarani do Jaraguá Kyre’y Kuery se apresentou. Intitulada Xondaro Jeroky, a primeira canção entoada pelo coro ocorria na transição do primeiro para o segundo ato, ao sairmos do forte dos colonizadores para a gruta onde Peri vive. Também coube ao Coro Guarani abrir o terceiro ato do espetáculo, após o intervalo, com a canção Xepe Xiaraju; momento no qual a ação se passava na tribo dos aimoré - onde Cecília, novamente raptada, se encontrava.

A primeira aparição do coro em cena ocorria pela plateia. Naquela cena, os colonizadores portugueses e os aventureiros espanhois faziam um pacto para combater a tribo dos aimorés lado a lado. Eles se uniam em oração, enquanto Peri ouvia Gonzalez elaborando, com seus comparsas, um plano para depor Don Antonio e raptar Cecília. Neste momento, David Vera Popygua Ju estendia um painel com os dizeres “Como é ser civilizado?”, junto a outro ator indígena, enquanto os integrantes do Coro Guarani avançavam pela plateia em silêncio, para encarar de frente a encenação. Enquanto o coro lírico cantava “Que venha o bando malvado [os aimorés] / Estamos contentes em lutar”, o Coro Guarani observava o palco. Naquele momento, era como se os artistas indígenas se questionassem: “Traição, exploração e extrativismo são características da civilização?”; “Ser civilizado é, em um momento, pedir a bênção de seu deus para, logo em seguida, conspirar contra seus irmãos?”

Nesta versão, o Coro Guarani e o coro lírico que representava os aimoré não eram retratados como figuras más e antagonistas. Eram personagens que se encontravam do lado oposto de um conflito, tentando defender as suas terras dos invasores extrativistas. Ao invés de representar uma suposta selvageria, eles eram colocados como guardiões da natureza. Na concepção cênica, este povo transformava-se em um “devir-ser floresta”, as cordas de seus figurinos e as redes nas quais os cantores repousavam transformaram-se em árvores. Em vez de um cacique aimoré, o cantor lírico Licio Bruno (único intérprete do personagem em 2023 e alternante do papel com Savio Sperandio em 2025) interpretava um antropólogo: um branco aceito pela comunidade e que tinha um papel social de participar dos ritos como um mediador ou tradutor entre mundos (espiritual e físico; indígena e europeu).

Entre os críticos, a recepção da montagem foi mista: os mesmos elementos foram tanto motivo de críticas negativas, quanto de elogios. As críticas vieram principalmente pela supressão do número de ballet durante o terceiro ato, no qual simula-se um ritual antropofágico. É bem verdade que o “ballo” se trata justamente do movimento que caracteriza a obra de Carlos Gomes dentro do gênero “Ópera Ballo”; no entanto, é um erro pensar em sua remoção como uma perda - vale lembrar: é nesta dança, valendo-se na concepção original de formas tradicionais da música turca, que vinha à tona uma visão exotizante dos povos indígenas. No final das contas, muitos dos “senões” apresentavam um caráter conservador ao questionar a “atualização” ou a moldura decolonial da montagem. As críticas que souberam dialogar melhor com as novas propostas foram aquelas que testaram se tais modificações funcionaram efetivamente.
Agora, a recepção do público que acompanhou as récitas foi calorosa e os ingressos esgotaram-se com certa rapidez. Em 2024, a montagem recebeu o prêmio Ópera XXI na categoria de Melhor Produção de Ópera Latinoamericana. Assim, para todos os efeitos, esta temporada de Il Guarany pode ser considerada um sucesso, o que levou ao Theatro Municipal de São Paulo convidar seus artistas para uma remontagem que ocorreu entre os dias 15 e 25 de fevereiro de 2025. Tendo a oportunidade de refletir sobre a montagem anterior e tempo para maturar as ideias, é lógico que nesta segunda versão Ailton Krenak e Cibele Forjaz foram além…

A nova encenação me pareceu ainda mais colorida. Em diversos momentos, quando estamos em ambientes ocupados por portugueses, caixotes de madeira preenchem o fundo do cenário, projetando gravuras que remetem a cartografias e imagens da colonização, ou até mesmo símbolos religiosos cristãos — aos poucos estas imagens são tingidas com intervenções de Denilson Baniwa. Ao longo do espetáculo, diversas pinturas produzidas por artistas indígenas tomavam o lugar das imagens de violência colonial.
A montagem de 2025 teve uma mudança de solistas: Enrique Bravo permaneceu como Peri e Marcello Vanucci veio para alternar a interpretação do papel com ele; já Cecília foi interpretada por Laura Pisani, alternando com Maria Carla Pino Cury. Em 2025, em vez de Zahy interpretar o duplo de Cecília, uma personagem branca, ela ganhou um papel novo: a Onça Pajé. É esta a personagem que é assassinada durante a abertura, transformando-se em espírito e desencadeando a guerra entre aimorés e portugueses. Sua presença torna-se mais contestadora. Ao lado de Zahy, a atriz Araju Ara Poty interpreta a Onça Corifeia, liderando o coro de onças que, no terceiro ato, irá realizar o ritual de canibalização da própria Cecília.
Ao contrário da versão de 2023 que creditava David simplesmente como “Peri”, o programa desta montagem creditava o ator como “Peri Eté”, ou “o Peri verdadeiro” em dialeto tupi-guarani. Isto reforça a ideia de que sua presença ali serve para contestar a imagem de um indígena criada por Alencar e Carlos Gomes. Ainda que a existência de um cantor lírico de origem indígena não seja impossível, mesmo que rara, me pergunto se realmente seria interessante escalar um cantor indígena para interpretar o papel sozinho. Isso porque o Peri-lírico, para todos os efeitos, é escrito como um heroi da cavalaria europeia, o ideal de uma figura masculina branca. Vale lembrar que, ao final do espetáculo, Peri se converte ao Cristianismo de forma a obter a bênção de Don Antonio para casar-se com Cecília e, só então, poder salvá-la, levando-a para a floresta. Colocar um cantor de origem indígena para interpretar um personagem que decide voluntariamente abrir mão de sua religião (e, por consequência de sua cultura e identidade) para salvar uma mulher branca pode ser uma imagem um tanto violenta.
Inclusive, a cena da conversão e batismo de Peri também recebeu a intromissão do Coro Guarani do Jaraguá Kyre’y Kuery. Antes que a música terminasse, o Coro Guarani entrava para realizar, com seus próprios instrumentos e idioma, a canção Nhanembaraete — me pareceu um ritual, ainda que não me recorde daquele momento oferecer legendas para o guarani cantado pelo coro. Enquanto Peri-lírico se cristianiza, Peri Eté parecia receber uma espécie de bênção de seu próprio povo. Outra anomalia de Il Guarany (romance e ópera) é justamente a figura de Peri enquanto um índio solitário, ao passo que a experiência indígena é profundamente ligada à coletividade.
É interessante reparar também que, se de um lado a escalação de artistas indígenas foi realizada como parte da linguagem cênica desta versão de O Guarani; de outro lado, a escalação de cantores líricos pretos talvez não tenha recebido a mesma atenção. Não existem personagens negros na ópera de Carlos Gomes, assim, tanto na montagem de 2023 quanto nesta versão de 2025, cantores pretos interpretaram os personagens dos colonizadores e exploradores — destaco aqui a interpretação de Andrey Mira como Don Antonio, pai de Ceci, em ambas as versões; e de David Marcondes como Gonzales, presente em ambas as versões e alternando seu papel com Rodrigo Esteves (cantor branco, em 2023) e Bongani Justice Kubheka (cantor negro e sul-africano, em 2025). No entanto, no romance de Alencar há uma personagem mestiça suprimida do libreto: a filha bastarda de Don Antonio, Isabel, que faz parte da segunda trama romântica da história e se apaixona por Don Álvaro, chefe dos aventureiros sob o comando de Antonio. Ao final da história, a moça comete suicídio ao perceber que seu amor irá morrer após o ataque dos aimoré. Se as obras de Alencar e Carlos Gomes são um projeto para a formulação de uma identidade nacional, é como se tanto o romance quanto a ópera excluíssem as pessoas pretas desta “identidade”.

É bem verdade que a prática do “colorblind casting” (ou seja, a escalação do elenco sem levar em conta o tom de sua pele) já é comum na cena operística, ainda assim é importante levar em conta seus limites de representatividade. Em decorrência da exibição gratuita do pro-shot da montagem de Amadeus (1979) realizada pelo National Theatre em 2017, Lucian Msamati (intérprete do compositor Salieri) refletiu sobre esta prática em entrevista para o jornal inglês The Guardian: o ator zimbabuense compara a cena teatral a um playground, dizendo que os encenadores e produtores brancos estariam dando a oportunidade de atores negros de brincarem no playground, só que tal espaço ainda pertence aos brancos. A prática do “colorblind casting” ou do “gender-blind casting” seria uma maneira de ressaltar o caráter universal das experiências humanas e de disputar qual seria o visual e a voz dessa humanidade — de acordo com Lucian, “o problema da terminologia ‘blind casting’ é se você está dizendo que idade, raça ou gênero não fazem parte da experiência humana.”
Retomando o enredo de Os Guaranis. Se, de um lado, o Peri-lírico se converte ao cristianismo para poder salvar Cecília, antes disso a sua amada também passou por um processo de transformação. Nesta versão de 2025, enquanto era mantida presa pelos aimoré, Cecília passa por uma espécie de ritual antropofágico: um manequim de arame, com suas vestimentas, era desmontado pelo coro de onças que pareciam devorar aquela figura. Terminado o ritual, a cantora lírica que interpretava Ceci retornava com um figurino similar ao do Peri-lírico. Com isso, a encenação reforçava uma ideia presente no subtexto do livro: a de que Cecília também precisaria abrir mão de seus hábitos culturais portugueses para se tornar Ceci; para conseguir sobreviver na floresta junto com Peri, ela também precisaria aprender os modos de vida dos povos indígenas, se tornar parte da tribo.
A todo momento, a encenação evidenciava a destruição promovida pelo modelo capitalista extrativista, que explora os recursos naturais até deixar o meio ambiente infértil para qualquer tipo de vida. Na cena da oração, uma broca gigantesca descia do urdimento e tocava o chão do palco - era como se os colonos estivessem rezando para aquele totem da destruição. Já no segundo ato, em uma cena no acampamento dos exploradores, a broca novamente descia do urdimento e perfurava o palco atravessando o assoalho até chegar ao porão; quando a broca saía do subsolo, ela retornava tingida de vermelho. Ao mesmo tempo, diversos paineis traziam dizeres apontando para o caráter ambientalista da atividade indígena, que propõe uma convivência mais harmoniosa com a natureza. Qualquer ambientalista e ecólogo sério entende que a demarcação das terras indígenas e a devolução dos terrenos para os povos originários é uma medida de enfrentamento à crise ambiental e climática que estamos vivendo; além de ser uma maneira de facilitar o reflorestamento daquelas áreas.
O final da ópera é o mesmo do livro: a única maneira que Don Antonio encontra para encerrar o conflito entre portugueses e espanhois (após deixar que sua filha vá embora com Peri) é explodindo seu forte com todos os colonizadores dentro. E, assim, com os corpos dos colonos espalhados pelo palco do Municipal, o Coro Guarani avançava do fundo do palco em direção ao proscênio. Eles eram liderados por Zahy Tentehar, em uma intervenção artística que, infelizmente, não incluía legendas. Mas, se fôssemos tentar adivinhar o que ela dizia, penso que seria algo na linha de apontar que a solução para a crise que estamos vivendo passa por escutar os povos originários e aprender com eles como manter o equilíbrio com o meio ambiente. Como se ela dissesse: o futuro precisa ser indígena. Não basta ceder o playground para os povos originários, é preciso se lembrar que antes de tudo o playground era a casa deles. É preciso perceber que o futuro da arte também é indígena.

A primeira temporada da nova versão de Il Guarany produzida pelo Theatro Municipal foi apresentada nos dias 12, 13, 14, 16, 17, 19 e 20 de maio de 2023, é possível assistir a uma récita desta temporada no canal de YouTube do Theatro Municipal. A segunda temporada foi apresentada nos dias 15, 16, 18, 19, 21, 24 e 25 de fevereiro de 2025.
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